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A alegria

dez
2012
17

escrito por | em Futebol, Vidinha | 1 comentário

Ontem o Corinthians foi campeão mundial, de novo.

Ontem eu não seria capaz de escrever nada. Por isso mesmo resolvi escrever hoje, após um longo, tenebroso e silencioso período onde eu preferi ouvi a falar por aí. Porque acho que mais do que o futebol, merece o registro a manhã de ontem.

Ontem, que acordei cedo e feliz num domingo. Eram 7h, e a Dé virou pra mim, ainda na cama e perguntou “Amor? Você tá bem? Tá nervoso?”, num primeiro momento dos já quase 3 anos de casamento onde lembro que, pela primeira vez, ela (não) acordou mais lúcida que eu. Tomei meu banho, vesti a camisa e saí pra buscar minha mãe, que mora a pouco mais de 5km daqui de casa. Pouca gente na rua, sendo metade com o manto alvinegro. Poucos minutos depois estava na casa da Paquinha, onde ela e a Pimpolhinha (a cachorrinha) estavam prontas pra vir pra cá. Entre um “vai Corinthians” daqui e um “é hoje!” dali, chegamos rapidamente em casa.

Ontem a Dé decidiu deitar na rede, e de lá acompanhar meu sofrimento. A mãe na poltrona, o sofá pra mim e meus tapas, berros e pulos. E lá ficamos, todos, calmamente sofrendo por um time cirúrgico e cuja eficiência já não preciso mais detalhar. A esposa curtindo a bagunça, a mãe que dizia estar muito preocupada comigo a cada jogo, mas que se mostrou mais nervosa que eu por tantas vezes. Eu? Nem sei descrever como eu era naquele momento. Mas fomos, todos, Corinthians a cada defesa do Cássio, e no gol do Guerrero.

Ontem eu chorei feito criança a cada momento que pude. Fosse no gol, num milagre, no apito final, na taça erguida ou no hino, tocando alto e lindamente no outro lado do mundo. Acabou ali, saímos pra comprar a cerveja e a carne pro almoço. A festa na rua sempre miúda e silenciosa, o cumprimento provocativo mas extremamente gente boa do santista da adega, do pessoal do mercadinho, do cara no ponto do ônibus que eu nem conhecia, mas que me deu um abraço. Quem era essa gente “que estava tão feliz por nada…?” Essa gente é aquela que não se incomoda em comemorar um momento de pura alegria como se fosse o último, não importando sob qual motivo.

Ontem o motivo foi o Corinthians – um motivo que quem vive sabe o quanto é capaz de unir uma família num momento espontaneamente perfeito. E sem dúvida, desde ontem, eterno. Que seja hoje o registro dessa felicidade, e que seja eterna a lembrança de umas 4 ou 5 horas das quais eu não seria capaz de retocar uma vírgula.

“Anti-Patia”

jul
2012
12

escrito por | em Futebol | 4 comentários

Torcer pro São Paulo é uma grande moleza.

Lembro perfeitamente dessa frase no início dos anos 90, quando o sabe-tudo Milton Neves pronunciava aos 4 cantos tal enunciado, em vista à de fato espetacular fase do time do Morumbi. O São Paulo saltava de time comum a um fenômeno mundial, com duas equipes (a titular e o “expressinho”, que tinha entre outros Rogério Ceni, Juninho Paulista, Caio Ribeiro e Jamelli) que ganhavam absolutamente tudo o que disputavam. Era um exemplo de gestão bem-feita, com elencos preparados e cuja cobrança da torcida não era maior do que a de seus rivais. O Palmeiras estava numa fila indigesta de mais de 15 anos, mas sua torcida permanecia fiel (sem trocadilhos) e fervorosa. O Corinthians havia acabado de conquistar seu primeiro Brasileirão, e deixado pra trás um estigma de time regional carregado por décadas.

E então acontece a primeira cagada. Mas amigo sãopaulino, antes de qualquer outra coisa, saiba que esse texto não é um alerta pra você, mas pros corinthianos (tomando uma história que começou em vocês por exemplo). Duvida? Leia até o fim.

A tal frase que inaugura esse texto foi proferida a plenos pulmões, e aos olhos dos adversários, colocou o SPFC acima do bem e do mal. Se o time faturasse mais um título (e faturou vários desde então, de fato a gestão iniciada anos antes rendeu muitos e muitos frutos, além de cópias aperfeiçoadas pelos próprios rivais – como o meu Corinthians, por exemplo, e seremos eternamente gratos por isso), “normal, esse time só ganha”. Se perdesse, qualquer sarro era respondido com “dane-se, somos bicampeões mundiais”. Eu nunca havia ouvido esse “argumento” de amigos santistas, sendo que eles já eram bicampeões mundias há 30 anos. E com o Pelé.

“We have a Hulk”, diria Tony Stark. Se eu fosse santista, mandaria um “we had Pelé”. Mesmo peso, menos verde, é verdade…

Enfim, o problema é que tal frase tornou-se mais ou menos um pensamento implícito no universo tricolor, naquela maioria que prefere ter razão a qualquer custo, do que simplesmente ter razão. E não, isso não é um mal exclusivo: soltamos fogos madrugada adentro semana passada, a porcada fez o mesmo ontem, e sim, todos têm direito a comemorar conquistas. Não somos freiras. Mas cacete… pessoas trabalham no dia seguinte, crianças têm aula, essas coisas…! Se eu não passo na frente de um hospital buzinando, vou fazer pior de dentro de casa? Posso chorar, encher a cara, beijar a TV, comemorar com os amigos, virar a noite cantando o hino do meu time, e mesmo assim não tornar a vida dos outros um inferno.

Voltando: o tal “pensamento genial” e marqueteiro do brilhante jornalista deu o tom a toda uma nova geração de torcedores. Conclusão: a antipatia pelo SPFC aumentou a níveis abissais. A ponto da rivalidade com o Palmeiras tornar-se quase uma questão de vida ou morte (enumere o número de pancadarias entre as torcidas de cada time), e o Corinthians – e sua torcida, incluo-me – que resolveu “rebaixar” o São Paulo a inimigo, não mais a rival. A asca era uma realidade.

2012. Ganhamos a Libertadores.

E a Nike, fazendo seu papel de Milton Neves, exalta loucamente a história dos “anti”. Que todos estão contra o Corinthians, que é o time contra o mundo, essas besteiradas. Cacete, eu sempre torci CONTRA os adversários sim, é fato na história do futebol que a alegria de uma torcida é uma equação que soma dois fatores: a alegria pelas vitórias (sim, vitórias, se meu time não visa títulos, adianta competir? Inteligência, minha gente…) com a desgraça alheia. Torcer contra FAZ PARTE, e TODO MUNDO torce. A graça é essa, Deus do céu… o sarro no dia seguinte, as apostas, o assunto no churrasco. Futebol é diversão, ou pelo menos deveria ser.

Pois bem: agora vejo os corinthianos batendo no peito, mandando geral “calar a boca”, e que “mesmo com os antis, ganhamos”. Sério? Mesmo com a lição vivida pelos rivais tricolores, vocês terão a mesma postura idiota de se colocar acima do bem e do mal? Nosso rebaixamento há 5 anos não serviu pra nada? A lição que deveria ser tomada, ou melhor, a frase que realmente todo torcedor tem que levar como lema não vem e nem virá pronta de nenhum jornalista, fornecedor de material esportivo, nem texto do Arnaldo Jabor. A paixão pelo time é sim vivê-lo, pro bem e pro mal, mas sem esquecer que hoje o dia é nosso – amanhã pode não ser, e as probabilidades disso são sempre maiores do que nossa chance de sucesso. Aí vem o esforço, a superação, a torcida, o talento, e pronto… olha o futebol de verdade aí.

As soluções prontas estão acabando com o mundo. Sejamos mais autênticos, mesmo que um ponto de partida possa ser a futilidade de se torcer por onze caras de uniforme correndo atrás de uma bola.

Libertador

jul
2012
05

escrito por | em Futebol | 4 comentários

Era 2007, e a gente caiu.

Foi sim um dos momentos mais tristes da minha vida, com meu pai sãopaulinando num telefonema pra mim assim que o jogo acabou. Sim, eu havia fugido pra Ubatuba, tentando bestamente escapar do inevitável. “E a segunda?”, foi a pergunta. Uma das tantas piadinhas tricolores que por anos tive que enfrentar dentro de casa, e que me deixaram com asca da postura daquela torcida do time do Jardim Leonor.

E o time jogou a série B, sem reclamar. Não ouvi em momento algum alguém dizer “o Corinthians não joga a segundona”. Fomos lá e encaçapamos geral. Voltamos com sobras, bonito, com uma molecada raçuda e uns caras bons pra burro. Mais ainda: com uma torcida inflamada – não menos fanática, mas certamente mais intensa. Por pouco não levamos a Copa do Brasil no mesmo ano, mas em 2009 estávamos lá, com Ronaldo decidindo e tudo mais. Foi bonito, um novo momento, um time que renascia e uma torcida que a gente sempre soube como funcionava. O orgulho da ressurreição era algo novo pra minha geração. Talvez não fosse pra anterior, que assistiu ao título de 77, mas pra mim aquele sentimento implícito trazia à tona a essência da torcida da qual sempre fiz parte, mas que ainda hoje aprendo a cada dia o que de fato significa.

Veio a Libertadores.

Perdemos pro Flamengo na Libertadores em 2010. O tal ano do centenário que não nos trouxe títulos – e isso pode parecer de fato um problema pra quem estava de fora, mas redescobrir uma história de cem anos em tantas comemorações, livros e filmes só intensificava ainda mais a força da tradição de uma equipe nascida nas mãos de cinco sujeitos, com meia dúzia de patacas e que desde sempre ralou a bunda pra mostrar seu valor. Levantamos um estádio. Uma piada a menos. A equipe lutou pelo Brasileiro, mas classificamos, na bacia das almas, pra Pré-Libertadores.

Veio o Tolima.

E acabou Ronaldo, acabou o oba-oba, voltou o sofrimento. Sim, porque nunca foi fácil, e quando foi a gente estranhou. De 98 a 2000 a gente passeava. Ganhamos um Mundial tão tranquilamente que parecia o Torneio Início. Brasileirão que vira obrigação, nada de lista de dispensas, e um time em pleno crescimento e comprometimento. Avassalador de início, o time nunca deixou de frequentar o topo da tabela. Era pra ser tranquilo, mas só garantimos nos minutos finais do último jogo. Porque aqui é Corinthians, e a gente sofre. Mas sofre de verdade, porque o Doutor morre na manhã da final, e à tarde a imagem é essa logo abaixo. Contra o Palmeiras. Porque história a gente escreve com as melhores palavras.

Veio a Libertadores. De novo. E eu escrevi isso.

Time seguro, goleiro novo, atacante novíssimo, volantes mágicos, zagueiros monstruosos, inspiração aleatória. Nenhum medalhão. Do outro lado, Diego Souza, Neymar, Ganso, Riquelme. Um baita técnico, que em algum momento disse “não querer enfrentar brasileiros ou o Boca”. Pegamos dois brasileiros, E o Boca. Na final.

Já havia me escangalhado de chorar no gol do Romarinho lá na Bombonera. Foi-se o primeiro tempo no Pacaembú, e eu passei quase todo em silêncio. A Dé, vendo toda a minha crescente tensão durante a Libertadores, resolveu me fazer companhia no último jogo. Saí da rede, fui pro sofá. “Pro meu lugar de sorte”, eu disse. E uns minutos depois, o Emerson manda aquela bala pro gol. Eu grito gol, e o grito emenda um choro compulsivo. Um filme passa pela cabeça, enquanto o corpo treme. Jamais tentarei explicar esse tipo de sentimento, e o que esse time faz comigo. A Dé me abraça, “eu só não entendo”, ela me diz. Eu sei que não dá pra entender, amor. Ela tava ali, eu no meu lugar da sorte. A lua cheia. Era sim a nossa noite.

Desce o Emerson, vem o segundo gol, eu saio pulando descontrolado e agora sim, gargalhando. Chegam torpedos. Um alívio inesperado, pela primeira vez eu me preocupo em quanto falta pra acabar. Mais uns minutos. “Cacete, vamos ganhar a Libertadores!”, a ficha cai. Rola um medo de acreditar, por mais besta que pareça. Faltam menos de 5… dá pra acreditar sim.

O juíz apita. Pronto, aconteceu. O choro volta, incrédulo. Minha mãe me liga, eu quase não consigo falar de tanto que choro. Passa um filme na cabeça, um monte de brigas estúpidas por causa de futebol, mas um monte de tiração de sarro, muita alegria, aquela sensação que sempre sinto quando saio com o manto sagrado, e algum desconhecido cumprimenta ou simplesmente manda o clássico “vai Corinthians”. Eu viro pra Dé e digo “parece besteira né”. Mas ela entende sim, mesmo achando não entender. Felicidade besta e pura, passional e irrestrita. Os amigos aparecem – por Facebook, SMS, e são palmeirenses, sãopaulinos, botafoguenses e flamenguistas. Um barato, uma delícia absurda… uma noite em que fomos campeões.

Da América, enfim.

Talvez sejam eles

mar
2012
08

escrito por | em Futebol | 2 comentários

Fim do segundo jogo da primeira fase da Libertadores. Ganhamos (num sufoco desgraçado de início – porém nunca ameaçados de fato), que foi virando tranquilidade tal a fragilidade do adversário, o “temível” Nacional do Paraguai pelo placar de 2×0. No mesmo dia de hoje, o Santos passeou sobre o forte (mesmo) Internacional, num show inspiradíssimo da dupla Neymar e Ganso, o Fluminense meteu 2×1 no Boca lá na Bombonera – um resultado memorável, e o Barcelona enfiou 7×1 no Bayern (sendo 5 gols só do Messi).

Deveríamos nos envergonhar…? Acho que não. E explico.

Enquanto corinthiano, já vi meu time em fases gloriosas (1995, 1998, 1999, 2005) e medíocres (malditos 1996 e 2007). Em ambos os casos, haviam certezas – fossem de vitória ou derrota, o time era aquele. E assim seria, de fato… o histórico tanto de êxitos quanto de vergonhas se seguiram e marcaram os anos. Em outros momentos, não tivemos grandes equipes, mas um ou outro astro – um batedor de faltas, um artilheiro, um meia ofensivo, um talismã. Nos apoiávamos neles, e assim, entre tropeços e saltos nos fizemos novamente.

Acontece que há mais ou menos ano e meio, nossa equipe mostrou-se uma coisa à qual não estávamos acostumados. Um time coeso, arrumado, mas em nada genial, apesar de termos no elenco jogadores capazes de decidir partidas em lampejos criativos: Alex, Danilo, Jorge Henrique, Liedson… contratamos até o Adriano, arriscando num cara de talento inquestionável – mas de péssimos hábitos. Nossos volantes são outro caso à parte: Paulinho e Ralf, que apareceram sendo nada, tornaram-se peças-chave num elenco extremamente ajeitado. Uma zaga com titulares e reservas muito bons – não são nenhum Gamarra, mas são mais confiáveis do que a concorrência. E até nosso goleiro, que depois de jogar com dedo quebrado e sair de campo batendo no peito e dizendo “aqui é Corinthians!” acabou com crédito com a Fiel. Enfim, temos uma casa conhecida, confiável e atualmente campeã nacional.

Mas que costuma se contentar em tocar bola no meio de campo, em não se impor se não houver espaço, e se ousar, que seja na última hora – precisando pra valer. Que quando marca um golzinho, continua na mesma pegada, sem vislumbramento nem grandes magias. 20 do segundo tempo, 1×0 pra gente? Tome meia, volante e zagueiro. E nesse quase regime de fome, vamos ganhando um pontinho ali, três aqui, e num dia de falta de sorte, perdendo aqui ou ali de vez em quando. Sim, porque apesar de tudo, a camisa grita, e nós continuamos ganhando de virada aos 47 do segundo tempo, com bola desviada na zaga adversária; conseguindo gols espíritas e inacreditáveis; quando precisando do resultado improvável do adversário em outro jogo, ele acontece; e quando erramos, eles erram também e fica tudo bem. Porque dá pra mudar estilo de jogo, elenco, mas mística… bem, essa não muda nunca.

Por isso mesmo, tem sido um trabalho danado torcer pra esse time de resultados: que comemora empate com Deportivo Táchira, e que sua litros pra ganhar em casa do Jabaquara paraguaio. Mas antes de arrancar o que me sobrou de cabelo, entre um “putaquepariu Jorgenrique!” e “juíz doentedocaralho!” me veio uma luz: talvez esse seja o Corinthians “mais Corinthians” que eu já vi, e existem motivos de sobra pra se acreditar nisso.

Quando o time é bom, a gente não sofre, e quando é ruim, também não – a gente espera a desgraça com esperança de um mínimo de vexame. Da mesma forma, quando tem um medalhão em campo, vira tudo ou nada em cima das costas do sujeito. Dessa vez, não tem nada disso: o técnico não é gênio nem estrela, o maior nome do time não joga (graças à incompetência dele mesmo, nem relacionado o cara é), e não existe um comandante de fato lá dentro de campo. Ou seja…

…é um time comunitário, onde todo mundo joga pra todo mundo. Joga junto, feio quando precisa, com lampejos de alegria e criatividade. Caga de medo e trinca os dentes quando o jogo é importante, mas não foge da pancadaria. Se abstém das egotrips dos estrelas, em prol de uma molecada voluntária. Não dá show, nem tem vergonha de chutar pra cima e afastar o perigo pra onde o nariz estiver virado. Ganha de meio a zero e chama de goleada. E peça a peça, avança num efeito dominó esquisito, deixando uma ou outra peça no caminho e sempre parecendo que hora mais, hora menos, a corrente vai quebrar. O time reticente, mas seguro e que joga de um jeito técnico e só dele… que talvez nunca tenha feito o torcedor sofrer tanto – não de desespero, mas justamente com essa proposta de “resultado a qualquer custo” – coisa que a gente comumente se acostumou a conhecer em outras equipes, e que nos causa estranhamento absoluto ser dessa forma, com a nossa camisa. Foi assim no Brasileiro. Tem sido assim na Libertadores.

É o Corinthians. Talvez mais corinthiano que nunca.

Um santo de todos

jan
2012
05

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Se algum dia fosse possível resgatar minha imagem enquanto criança odiosa ao clube do Parque Antártica, no ápice de sua seca de títulos, seria impossível imaginar que dia desses eu faria alguma homenagem ao Palmeiras – clube ao qual tenho profundo respeito desde a ascenção fulminante (e justa) daquele time aqui do Jardim Leonor, cuja torcida tornou-se tão áspera e prepotente que mereceu pra si um universo que eles mesmos enxergam sua equipe: um lugar isolado, onde somente eles importam e o mundo gira ao seu redor. Deixem-nas lá, então. Eu prefiro a rivalidade, a história e o respeito a adversários históricos. Somos centenários, assim como os alviverdes estão prestes a se tornar, e quando de sua queda à série B, aprendi que um campeonato sem os “rivales” não é um campeonato que mereça muito carinho. Creio que, num momento particular de humildade e pureza, tenham sentido nossa falta quando caímos também. E ambas as torcidas assim o fizeram, tenham certeza, após esgotar a tiração de sarro dos arquirrivais. Afinal de contas, isso aqui é futebol, e legal mesmo é ganhar – principalmente se for em cima deles.

Por isso mesmo me entristece sim a aposentadoria do Marcão. Um goleiro tão brilhante que ofusca nesse momento alguns grandes ídolos da história palmeirense. Oras, os caras já tiveram Velloso, Zetti, Leão e até Oberdan Cattani e Valdir Joaquim de Moraes – dois monstros históricos os quais eu não vi jogar. Uma unanimidade na torcida rival, o tal São Marcos era sim senso comum entre todos os outros apaixonados por futebol. Sua simplicidade caipira lembra em muito os verdadeiros boleiros que fizeram história nesse país. Nada de R10, F9, L12 ou essa putaria americanizada. Marcão sempre foi Marcão, e eu não conheço uma pessoa que não pare e sorria ao ouvir meia dúzia de palavras da boca do sujeito.

Assim como assistí-lo jogando. Sim – eu, corinthiano e sofrido com o rapaz jogando ali do lado oposto, sentia que o chute do Marcelinho não seria tão eficiente quando encontrasse do outro lado um cara com a competência do Marcão. Ele nos enterrou duas Liberators, acabando com os celestiais pés do nosso meia. Xinguei, emputeci, odiei o cara por alguns bons dias. Mas como não admitir que a coisa ali era parelha, a ponto de ambos os talentos se equivalerem? Era o Palmeiras grande, que nos causava temor a cada clássico, e que justificava derrotas ou vitórias com a grandiosidade de confrontos igualmente bíblicos.

Por isso mesmo, estranho foi vê-lo jogando a série B dois anos depois de ser pentacampeão mundial (jogando como titular, fica a dica). O cara tinha amor à camisa. Coisa que a gente, que colecionava álbum de figurinhas e viu uns caras como o próprio Marcelinho, Ronaldo Giovanelli, Wladimir, Biro-Biro e o próprio Dr. Sócrates sente tanta falta hoje em dia. O bicho não saiu do chiqueiro nem quando a lama passou o cercadinho.

Muito respeito. Nunca desmereceu adversário. Nunca justificou um fracasso pontual (como a goleada pro Vitória ou a própria série B) falando das glórias passadas. Marcão jogou o presente. Arrepiou a estrutura política e esportiva dos rivais sendo somente sincero. Jogava uma bola surreal, e arrebentou com muito sonho nosso. Não importa. Engrandeceu o Palmeiras, e a gente também, pois grandes rivais são feitos de grandes histórias. Saiu por cima, em silêncio e ídolo, tenha certeza, de todos nós.

Doutor

dez
2011
04

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Estávamos no aeroporto de Congonhas. Eu, possivelmente no colo da minha mãe, ou caminhando meus primeiros metros (ou nem tão primeiros, realmente eu não me recordo). E Paquinha sempre me contou essa história com um sorriso na cara… que avistou aquele rapaz e me levou até ele. Um cara barbudo, cabelo desgrenhado, magro de dar pena. Se aproximou, e me disse:

– Olha Celo, é o Sócrates…
– Que homem feio, Paquinha…!

E o doutor, que poderia emputecer, vira pra minha mãe – que já estava completamente sem jeito – e com toda a calma do mundo, após me dar um beijo no rosto, diz:

– Esquenta não senhora. Criança é sincera mesmo.

Foi esse o meu vexatório encontro com o Magrão. Eram meus primeiros dias como corinthiano, e aquele cara feio de doer se tornaria na minha vida um dos nomes mais importantes da minha paixão alvinegra. Num dia como o de hoje, onde disputaremos uma final ideal contra nosso arqui-rival, num Pacaembu todo preto e branco, lotado e lindo, valendo nossa quinta conquista nacional e com enormes probabilidades de terminarmos o dia em festa, é absolutamente triste pensar que esse cara não estará aqui, neste plano, com a gente. Seja pra comemorar ou pra xingar. Sócrates foi uma das personalizações mais perfeitas desse time do povo, e um brasileiro daqueles que todo mundo devia se orgulhar. Imperfeito como todo ser humano, um monstro com a bola nos pés, uma voz completamente respeitável.

Vai em paz Magrão. Que puta sacanagem você nos deixar.

Fenoveno

jun
2011
07

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Estávamos eu, Delay, Joãozinho, Lierson, Julião e Caê no Pacaembú, completamente tomado. O Sport já ganhava por 1×0 quando conseguimos entrar, no glorioso Tobogã. Fiel dominando. Seria o último jogo de André Santos e Cristian pelo Timão, e lá na área estava ele, esperando calmamente a bola chegar. Claramente fora de forma, comparado aos outros 21 em campo, Ronaldo tinha sempre um na cola, e aparentemente não oferecia perigo algum. Estávamos de frente pra ele, e durante as duas descidas do Timão, acompanhei com os olhos os laterais (ou quem descesse, não me lembro). Mas lembro sim de olhar pra área e não achar mais o cara. Sim, ele já estava posicionado. O zagueiro por duas vezes o perdeu. Nas duas ele subiu, e marcou, de cabeça, que nem seu forte era. Duas jogadas, e o Corinthians virou o jogo – que teria seu placar final num 4×3. Saímos de lá, e o único comentário era: “É, o gordo é foda“.

E ele jogou pelo meu time. Foi uma honra. Valeu Ronaldo.

100

set
2010
01

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Só lembro de estar na sala, esperando meu pai voltar da padaria, e enquanto isso assistia à final do Paulistão de 88 entre Corinthians e Guarani. Meu pai havia comprado pra mim o time de botão do Guarani, que fazia companhia na caixinha ao do Coritiba. Havia lá um do São Paulo, o qual sabe-se lá por quê nunca relei o dedo. Lembro também de no primeiro tempo da prorrogação colocarem pra jogar um tal de Viola. Achei o nome ótimo daquele neguinho magrela, e passei a prestar um pouco mais de atenção ao jogo. E então, aconteceu isso:

E acho que foi aquela multidão soltando fogos, berrando e pulando que me deixou com cara de bobo, não entendendo absolutamente porra nenhuma do porquê aquilo ser tão importante, tão grandioso. Eu só tinha oito anos, e nunca havia visto uma festa tão grande. Só mais tarde eu fui entender que tudo era sofrido pra esse povo, e por isso mesmo, comemorado como se fosse a última coisa a se fazer. Foi encantador, e definitivo.

A paixão surgia ali. E a cada jogo, dali em diante, a cada gol a festa se repetia. Daquela forma, somente naquelas cores. E cada vez maior e mais intensa. Não era necessária idade tampouco experiência pra entender o que era o Corinthians. E hoje, 100 anos depois do lampião, 30 milhões se encantam, vibram, torcem e choram nessa nação, cujos habitantes jamais pensaram em cruzar seus territórios. E ainda tem lugar pra muita gente.

Eternamente, dentro dos nossos corações.

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Nas quartas de novo. E não, nenhuma surpresa. Assim como todo mundo, obviamente eu torci, e bastante, pelo nosso sucesso. E quem torce o faz porque é inevitável: a camisa tem o nome do país, a seleção já mostrou dias muito melhores, e a esperança é inevitável, por mais medíocres que sejam os jogadores, os comandantes, o presidente. Levamos um sabugo laranja de uma seleção igualmente ruim (no meu ponto de vista – a Holanda já viveu dias bem melhores, e assim como a Itália em 2006 e a própria Espanha em 2010, está entre os quatro jogando um futebol pra lá de duvidoso).

Fácil mesmo é analisar e detonar depois do resultado. Assim como fizeram ontem com a Argentina, me dizendo que de nada valeu a passionalidade dos hermanos. Cada um com a sua opinião. Maradona, assim como Dunga, não é e nunca foi técnico. E assim como Dunga, é líder. E líder lidera, mas não resolve quando do outro lado existe um líder E técnico. Ao contrário do Brasil, pelo qual torci naturalmente, mas que não me emocionou em momento algum dessa Copa, gostei dos jogos da Argentina, sim. Assim como os dois últimos do Uruguai (contra Gana, com Loco Abreu matando meio mundo do coração, e o jogo contra a Coreia do Sul, que foi emblemático). A Alemanha encaçapou a seleção de Maradona ontem com propriedade, e um futebol de quem é virtualmente tetracampeã. Futebol bonito. Assim como foi o dos Argentinos enquanto sua defesa não foi testada. E o dos uruguaios, que vêm melhorando a cada partida. E como não foram os de Itália, Inglaterra, França, África do Sul. E Brasil.

Não entendi a diferença de levar um gordo (como Ronaldo e Adriano em 2006) e um contundido (Kaká em 2010 – e aposto que, quando defenderam a convocação do pobrezinho do ex-sãopaulino, essa comparação incômoda não foi feita). Muito menos essa antipatia e a imagem militar de uma seleção com quase nenhuma criatividade que tivemos nessa Copa. Os volantes nem eram os melhores. O meio-campo, longe de ser o mais confiável. Enfim… quando não se tem o melhor num lugar onde o que se exige é justamente o máximo, fracassamos. Felipe Melo fez exatamente o que vivemos execrando nos botinudos argentinos. Vamos crucificá-lo. E se ele for o melhor da posição daqui a quatro anos, não vamos chamá-lo. Porque ele é Judas. Assim como Roberto Carlos em 2006, Ronaldo em 2002 e o próprio Dunga em 1990: os três, já campeões pela seleção. Enfim, nada de lógica. Assim como com Dunga, que foi sensato, ético e comprometido até o segundo gol da Holanda, e dali em diante substituiu mal, deu chilique no banco e deixou o cargo. Ou Jorginho, que de excelente auxiliar, mostrou pela última vez seu lado de “cavalo do Senhor”, com uma falta de educação digna de quem sabe não ter competência para estar ali, mas por estar, afasta as críticas aos coices.

A Copa está sim muito boa. Sobraram o valentíssimo e cada vez mais admirado Uruguai; as pragmáticas, eficientes e modernas seleções (certamente admiradas por Dunga, Mourinho e outros “treinadores” da escola de bons resultados em detrimento do bom futebol) de Espanha e Holanda; e a surpreendente e massacrante Alemanha, que joga um surpreendente futebol bonito (também jogado pela seleção de Jürgen Klinsmann em 2006, devidamente melhorada e evoluída por seu ex-assistente Joachim Löw). Torço por Uruguai e Alemanha, e ironicamente, em caso de fracasso de ambas, teremos um novo e inédito campeão mundial, o que é sempre muito legal. A Copa está sim viva e muito boa. O bom futebol, infelizmente, foi pouquíssimas vezes apresentado. Pela nossa seleção, que eu me lembre (pois já estou esquecendo dos poucos momentos de alegria proporcionado), talvez somente sobre a Costa do Marfim, com aquele resultado de 3×1. Com um gol “de mão”. Mas Copa é Copa.

Inevitável é a torcida, sempre. Mas dessa vez, já diria Flávio Gomes, nem muito orgulho, nem muito amor. Por dias melhores, e um futebol falado em Português, torcendo por dias de mais futebol, menos volantes, com jogadores de mais talento, mais simpatia, e menos picuinhas com a imprensa. É só futebol… nada mais do que isso. Que seja, pelo menos, emocionante. Não essa coisa chata e insípida que assistimos.

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Hoje jogaram Argentina e Coreia do Sul, e o grupo de Don Diego aplicou sonoros e convincentes 4×1 na seleção asiática. Antes mesmo do jogo começar eu já havia saído de casa, e naquela escolha que todos nós fazemos assim que saímos do banho, eu optei pelo manto azul e branco de nossos hermanos como roupa do dia.

Um grande teste, e para quem me conhece, sabe o quanto eu me divirto com essas coisas.

Sair para almoçar com uma amiga, e passear com tais vestimentas concretizou aquilo que eu já imaginava acontecer: neguinho buzinando, fulano me mandando tomar no cu, gente passando e me mandando “felicitaciones” pela vitória matutina. Até o teste do anão eu fiz, e quando estávamos lado a lado, eu chamei mais a atenção do que o pequeno transeunte.

Gente que passa com cara de incredulidade. E é engraçado isso… porque o sentimento de rivalidade aflora de tal forma durante a Copa que um argentino nas ruas brasileiras equivale a um corinthiano caracterizado passeando nos arredores do Parque Antártica. É provocativo, beira à inconsequência, dada a reação geral. Parece sim que a qualquer momento alguém vai te empurrar escada rolante abaixo.

Com exceção desse período, os outro quase 4 anos de intervalo entre uma Copa e outra causa certo desconforto cada vez mais raramente. A coisa se popularizou, e fica cada vez menos vergonhoso admitir admiração pelo futebol porteño. Mesmo porque difícil é desmentir que parte da passionalidade da seleção adversária seria sim muito bem-vinda na equipe canarinho, que cada vez mais parece um “juntado estrangeiro” sem alma e sem identidade com o país defendido.

Mas se eu disser que em algum momento demonstramos estar com dor de cotovelo, aí sim me jogam pela janela. Então é melhor ficar quietinho…