Corre negada…!

nov
2011
10

escrito por | em [Viagem] Peru/Bolívia 2011 | Nenhum comentário

17/set/2011 – dia 3
La Paz/Puno/Cusco

Reclinamos as cadeiras e nos permitimos descansar. Ladeamos o Titicaca e ao final da tarde as coisas pareciam bastante tranquilas, quando num súbito de emoção, invade o “silêncio” do ônibus nosso motorista, minutos após adentrar uma cidade cuja aparência era semelhante a algo inacabado, e diz em alto e bom som:

– La migra.

E fecha a porta. As pessoas começam a levantar e sair. Havíamos chegado à fronteira com o Perú, mas em nada aquele cenário se parecia com o que a Debs havia nos dito durante o planejamento da viagem. Atrapalhados e desajeitados, saímos rapidamente, sem nos darmos conta do frio absurdo que fazia do lado de fora (as janelas do ônibus “não abriam”, como dito no texto anterior).

Os que possuíam passaporte pra um lado, os com RG pro outro, onde teriam que xerocar os documentos para protocolar a entrada no país – sim, leve SEMPRE uma grana trocada no bolso. Banheiros a um sole, fomos resolver nossas vidas. Entrei na fila dos passaportes. Uma moça me aborda em inglês, eu respondo em espanhol. Ambos com cara de que não entenderam muito bem pergunta e resposta, eu pergunto “Where are you from?“, e ela responde “Portugal“. E em português, tudo ficou muito mais simples.

Documentados e aliviados, atravessamos a ponte a pé (e correndo, porque estava um frio pra cada um). O ônibus permanecia estacionado, quando entramos no local onde são emitidas as autorizações para estadia no país. Assim que eu entro, um bolivianinho me aborda todo solícito, e eu automaticamente deixo que ele preencha meu formulário – era muita informação em pouco tempo, e sim, eu estava confuso. Olho pra Debs e vejo ela preenchendo o mesmo papel, sozinha. “É só ler e preencher, amor“, ela me diz olhando pra minha cara com uma expressão de “vai soltar uma propina pro chicando aí de novo, bobão“. Paguei o sujeito com algumas moedas, e momentos depois encontraria a Mel na fila, que fez a mesma coisa que eu. Mas antes disso, junto à Debs, olho pra fora e vejo o ônibus atravessando a ponte, com minha mãe e seu discreto blusão vermelho lá dentro, toda pimpona.

– Amor! Olha o ônibus! Tá indo embora, caceta! Minha mãe tá lá dentro! O que a gente faz, putamerda?! Tá indo embora, tá indo embora! Vamo lá! O que eu faço…?

Sim, foi essa a minha reação, narrada de forma dramática pela minha esposa toda vez que contamos essa história. Foi ridículo, porque foi acabar meu desespero e meu repertório de palavrões pro coletivo estacionar em frente à casinha. Burro. Voltamos pra fila. A Debs preenche a ficha da minha mãe, e vamos nós 4 pra aprovação do sujeito que parecia o Elvis mais moreno no balcão. Duas passam: Debs e Paquinha. Dois reprovam: eu e a Mel – os dois tontos extorquidos pelo boliviano. No meu caso, foi rasurar minha data de nascimento errada e resolver o problema. No caso dela, teve que preencher tudo de novo, uma vez que o sujeito trocou o nome Melissa por Joaquim – é quase igual mesmo nome de pai e filha. A germânica quis esfolar o boliviano, mas de comum acordo resolvemos deixar pra lá, evitando assim um incidente diplomático de proporções épicas.

Voltamos ao ônibus. Em vários bancos, uns frangões assados, arroz… enfim, uma galera comprou o jantar ali mesmo, e a farofa rolou solta, embalada por um filme* dublado em espanhol do Jackie Chan. Pra nossa surpresa, todo mundo riu loucamente e se divertiu pra burro com o tal filme. Enquanto isso, passávamos por Puno – uma cidade em que a princípio passaríamos uma noite, mas quase todos os planos pra viagem acabaram sofrendo alterações razoáveis**, e isso não aconteceu. Daquilo que pudemos ver pela janela do ônibus, nenhum arrependimento. A cidade não possuia nada que fosse suficientemente interessante para a tal pausa. Seguimos viagem, num ritmo absurdamente lento, com o motorista respeitando as lombadas como um súdito respeita a realeza. Quantas não são as viações nacionais que fariam o mesmo trajeto pela metade do tempo…?

De tudo isso, o mais importante foi que chegamos. E bem. Pegamos dois táxis na rodoviária de Cusco e seguimos para o nosso novo hostel. Chegamos por volta das 4h30 ou 5h, e mais uma surpresa nos aguardava por lá. Mas isso, eu conto daqui a pouco.

* Filmes de viagem mostraram-se muito mais do que uma simples fonte de entretenimento. São termômetros, diretamente ligados à qualidade da sua viagem. Por exemplo, esse que assistimos, não foi nada traumático, mostrou-se um tanto precário, mas cumpriu seu papel. Exatamente como nosso ônibus. E a tese será comprovada em relatos futuros, nas outras viagens. Fiquem atentos.

** Yara Mansur, minha ex-chefe e tremenda amiga, postou em um dos comentários pré-viagem nesse mesmo blog a seguinte sentença: “Meu caro, planos de viagem são ótimos. Supresas de viagens também. Desejo a vocês um monte de desvios das planilhas, dos cálculos e de tudo que já será familiar quando vocês chegarem por lá. Aprendi a gostar das surpresas e dos imprevistos. Eles fazem a viagem tanto quanto os planos. Boa viagem, em todos os idiomas, para você e suas meninas. Bjão.”. Profetizou, Yara.

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